segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Descoberta Indiscreta - parte II

(continuação da Descoberta Indiscreta - parte I)

Puxou para si o teclado e o rato do computador e introduziu a sua palavra-chave. Abriu caixa de correio e preparou-se para a árdua tarefa de encontrar a mensagem do seu amigo. Ao contrário do telemóvel, o seu endereço de correio electrónico era muito conhecido e as mensagens não tinham parado de chegar, incessantemente, desde o dia em que a descoberta se tinha tornado pública.

Havia mensagens de todos os tipos possíveis e imaginários, isto para não falar das mensagens de SPAM que lhe propunham toda uma infindável panóplia de produtos e serviços. Felizmente instalara um programa que lhe eliminava a esmagadora maioria destas mensagens, no entanto algumas conseguiam iludir o automatismo e lá lhe apareciam oferecendo as mais fantásticas soluções para, entre outras coisas irrecusáveis, melhorar o seu desempenho sexual ou para aumentar o tamanho do pénis.

Costumava brincar com os seus colegas dizendo “alguma daquelas tipas que levei para a cama deve ter ficado insatisfeita e decidiu fazer-me um favor dando o meu endereço a especialistas reconhecidos na matéria...”. Maneira de falar e de brincar, pois sempre optara por se manter fiel aquela relação que já durava há quase vinte e cinco anos, e para a qual não tinha sido necessária a bênção de um padre nem o formalismo de um conservador.

Lá estava, finalmente, a mensagem do seu amigo do CERN. Abriu-a e começou a ler com a atenção que o cansaço acumulado lhe permitia.

Como raio se teria o amigo lembrado daquelas condições?... que aplicação útil poderia resultar dali?... Recostou-se de novo na cadeira e fechou os olhos para melhor se concentrar no desafio que lhe era proposto. Durante vários minutos ficou assim, montando mentalmente as condições e prevendo os resultados, como quem joga uma partida de xadrez sem usar tabuleiro.

De repente esbugalhou os olhos como se, nesse preciso instante fosse necessário ver alguma resposta estampada à sua frente. Continuou de olhos esbugalhados e olhar vago à medida que se foi endireitando na cadeira. Depois, como se repentinamente tivesse tomado uma importante decisão, numa súbita necessidade de reproduzir no tabuleiro o xadrez mentalmente jogado, retirou uma folha de papel do tabuleiro da impressora, pegou num lápis e começou a debitar fórmulas e símbolos matemáticos, uns a seguir aos outros... retirou uma segunda folha do tabuleiro da impressora... e depois uma terceira.

Dispôs as folhas lado a lado e ali ficou durante algum tempo, a olhar para elas, procurando encontrar uma jogada ilegal, de um cavalo que não desenhou correctamente o “L”, de um Bispo que se desviou da diagonal, de um peão demasiado apressado... de uma divisão por zero, de uma tangente de um ângulo recto, de uma co-tangente de um ângulo nulo ou raso, de uma raiz quadrada de um número negativo, de um logaritmo de um número que não fosse maior que zero...

Mas não, todas as peças se tinham movido escrupulosamente dentro das regras, não havia nenhum erro, nenhuma passagem em falso, nenhuma violação das regras da matemática que o pudesse salvar daquele desfecho inevitável e inquestionável...

(Continua)

4 comentários:

Rui disse...

O meu primeiro impulso foi escrever que com a matemática não se brinca. Mas não acho que seja verdade, brinca-se e pode até ser divertido. O que nunca se pode querer é ganhar à matemática. Nisso, não temos hipótese. Quando ela está certa.

(tens razão; ando à procura da melhor maneira, se é que isso existe)

Shelyak disse...

Humm... se é que me é permitido - e espero não ser levado a mal - podemos ganhar à matemática sim; basta olhar para trás e recordarmos que o Kasparov chegou a ganhar algumas partidas ao Deep Blube embora, no conjunto, tenha perdido...:)
Muito bons textos, ambos, parte I e II, não só pela forma como estão escritos mas também por várias questões que nos fazem sorrir um pouco.
Abraço

MARIA MERCEDES disse...

...isso não se faz! Deixar-nos ficar pendurados na expectativa, como se fossemos o Gato de Schrodinger dentro da caixa...

Não se faz!

beijinhos nas cordas

Anônimo disse...

sinceramente
adoreiiiiiiiiiiiiiiiii